30/09/2008

"A imagem do cachorro morderá no futuro?"



Entrei em contato com um pequeno texto de um filósofo-pensador das imagens - Vilém Flusser. O título do texto é justamente este: "A imagem do cachorro morderá no futuro?"

Flusser discorre sobre algumas características da imagem fotográfica com o objetivo de refletir sobre o que disso resulta pensando em mudanças de consciência, cultura e da vida em sociedade. Em especial, o filósofo se concentra em um aspecto específico da imagem fotográfica (lembrando que o texto é de 1983, portanto, num certo sentido, suas reflexões podem ser expandidas para outros tipos de imagens tendo em vista todo o universo virtual que estamos criando): a sua reprodutibilidade. Seu suporte é móvel, transferível, ou seja, a fotografia pode passar para o jornal, a revista, cartaz, lata de azeite... (agora para o site, o blog etc).

A própria superfície da fotografia é imagem. Por ela passam as cenas do mundo, nos orientamos por elas como nos orientamos pelos mapas. O que importa, diz Flusser, é a informação que a imagem passa, seu aspecto objetivo. "Querer possuir fotografia de uma cena de guerra não tem sentido: sentido tem querer a fotografia para ter informação quanto ao evento."

O filósofo da fotografia chama a atenção para a revolução que se anunciava na época e estamos vivendo hoje a todo vapor: Sendo que a fotografia "significa" uma cena, então a fotografia da cena de guerra pode passar a ser o "significado" do evento fotografado. Em outros termos, a imagem passa a ser o próprio evento, passa a ser a "realidade". Estamos imersos numa "sociedade informática".

Na "sociedade informática", o valor das coisas e as próprias coisas residem no universo imagético. Ou seja, tudo que é humano - os sentimentos, as emoções, os pensamentos - existem em função das imagens. E, sendo assim, o poder se transfere para os "proprietários" da informação imagética, para os que produzem a informação, para os "programadores". Num mundo assim, estamos constantemente submetidos à força dos agentes produtores das informações que circulam em nossos meios: mídias, canais de informação, propagandas, noticiários etc.
Num certo sentido, aqueles que produzem as imagens - os "fotógrafos" - têm o poder de submeter uma suposta "realidade", os fatos objetivos ao seu "gesto fotográfico": ele estrutura as ações, programa as informações... Mas, diz Flusser, "A indústria fotográfica exerce poder sobre o fotógrafo, ao estruturar seu gesto de fotografar, e ao limitar sua ação às possibilidades programadas no aparelho. A indústria fotográfica exerce poder sobre a câmara, ao programá-la. O aparelho industrial, administrativo, político, econômico e ideológico exerce poder sobre a indústria fotográfica, ao programá-la. E todos estes aparelho gigantescos são, por sua vez, programados para programarem."

Portanto, a resposta para o título do texto é afirmativo: Sim, a imagem do cachorro morderá, uma vez que não há mais cachorro, mas a imagem do cachorro. Com isso, tudo que é humano se molda, se programa.

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